West Street

Os meus dias ainda eram mais secantes que na realidade. Não ouvia novidades de Jane há um mês, dos meus pais há dois e, é claro, de Jaz, há cerca de um ano. A face inocente e amável dela ainda me passava pela cabeça, dia sim dia não. Hoje era um dia sim. Nesses dias, tinha de aliviar a mente dos livros - principalmente dos de romance - e dar um passeio pelas ruas de Kilburn.

Hoje sentia-me especialmente entediada. Nada acontecia na minha vida, era sempre tudo igual e sempre a mesma coisa, todos os dias. Mas por um lado, felizmente hoje não ia estudar, também não estava com disposição e não... Ajeitei a mala ao ombro enquanto caminhava pelas ruas e quando um raio de sol me incidiu sobre a cara debrucei-me sobre a minha mala enquanto procurava pelos meus óculos de sol.
- Merda..- sussurrei quando não os encontrei e já só me senti ir contra alguma coisa.

Senti-me aliviado ao sentir o meu telemóvel a vibrar dentro do bolso. Finalmente, novidades! Sorri inconscientemente e, enquanto verificava a mensagem que recebera no meu telemóvel, embati contra algo. Reconheceria aquele cheiro de qualquer lado e, à medida que levantava rapidamente a cabeça, todas as minhas suspeitas foram confirmadas. - Oh, desculpa - pedi, alterando o tom da minha voz e continuando a olhar para baixo para não ser reconhecido. O que é que ela estava ali a fazer?! Será que Martin estava por perto?!

Aquele cheiro não me era estranho, aliás, nada estranho. Passei as mãos pelo cabelo, tentando penteá-lo da melhor maneira possível e quando levantei o olhar, o meu coração desatou a bater desenfreadamente. Eu iria sempre reconhecê-lo, fosse em que sítio fosse.
- Bernard..- a voz saiu-me rouca. Eu não conseguia acreditar que era mesmo ele que estava ali.- eu..tu..ahm..desculpa eu.- passei a língua pelos lábios, mordendo depois o inferior.

Crianças. Nós estavamos a portar-nos como crianças. O nosso relacionamento era algo do passado e, mesmo que a minha paixão continuasse no presente, era óbvio que uma rapariga como ela já teria seguido em frente. Abracei-a como se nada fosse e fingi-me super animado - Jaz! Hey, nem te estava a reconhecer! - menti.

Se o meu coração já estava descontrolado só de o sentir ali ao pé de mim, quando me abraçou as coisas só pioraram. Eu tinha tantas saudades dele, de o sentir junto de mim. Inspirei bruscamente, fechando os olhos com força e os meus braços rodearam o seu corpo quase de forma instintiva.
- Estou assim tão diferente? - perguntei baixinho. Comporta-te Jazmyn, o teu tempo já passou.

Nisso não conseguia mentir. Ela estava igual. A mesma face, o mesmo corpo, a mesma voz inocente. - Não, simplesmente... não imaginava ver-te por aqui. - esta parte era verdade. Por muito que quisesse (ou não) estar com ela, não imaginava vê-la ali. Naquele momento. No meio da rua. De Kilburn! Killburn! O que é que ela estava a fazer num local tão... distante?

Afasta-te Jaz, afasta-te! Mordi o lábio com força, enquanto obrigava os meus pés a mexerem-se e dei por mim a largá-lo, sentindo-me de novo vazia. Estava mais do que comprovado de como sentia a sua falta. Assenti ao que disse, obrigando-me a esboçar um pequeno sorriso.
- Também continuas igual.- murmurei.- e sim, devo confessar que também nunca pensei encontrar-te por aqui.

O quão era difícil olhar para ela. Como é que era possível ainda estar apaixonado? Ela tinha seguido em frente. Se calhar nem precisava disso, se calhar nunca tinha sentido por mim o que sentia por Martin. - Então... que andas por aqui a fazer? Férias? - diz que sim, diz que sim, diz que sim, por favor, diz que sim.

Será que ele já me tinha esquecido? Será que ele já tinha seguido em frente? Mas seguir em frente do quê Jazmyn? Vocês não tiveram nada e a culpa foi inteiramente tua. Mordisquei o lábio e tentei controlar a minha vontade de lhe perguntar.
- Não, mudei-me para cá depois de o Brooms fechar.- encolhi os ombros.- e tu?

Fiquei completamente à nora. Por um lado, talvez isso tenha sido bom, assim consegui ignorar a sua pergunta - Espera, espera! Rebobina... o Brooms fechou?! - perguntei, chocado. Se eu bem me lembrasse, aquele colégio tinha um grande potencial e poderia continuar aberto por muito mais tempo. Muito mais, tipo, anos. Não meses.

Suspirei quando não obtive resposta. Eu só esperava que ele também vivesse cá agora, queria ter oportunidade de o ver de novo, já que não podia fazer mais do que isso, vê-lo. Assenti à sua pergunta e encolhi os ombros, enquanto ajeitava a mala sobre um deles.
- Sim.- murmurei.- pelos vistos aconteceu qualquer coisa, que ninguém sabe muito bem o quê. e aquilo foi à falência.

-Mas, quando é que isso aconteceu? - continuei, não só pela curiosidade que tinha em saber, mas também porque sabia que ao mudar de assunto, ela esqueceria o anterior. Talvez não a tivesse de encontrar de novo, já que não a tinha encontrado até agora.

Ele estava a desviar a conversa, dava para ver perfeitamente. Olhei em volta, enquanto tentava não demonstrar que dava importância e encolhi os ombros.
- Há pouco menos de um ano.- murmurei e olhei-o.- então, mas diz-me, estás cá de férias ou vives cá e por alma de sabe-se lá quem só nos vimos agora? - eu não me ia esquecer, ele bem que podia tirar o cavalinho da chuva.

Mentir, não adiantava. Ela conhecia-me demasiado bem, e isso tinha-se confirmado agora mesmo. - Estou... estou cá a viver. Pelos arredores, pelo menos - na realidade, a minha casa não era muito longe do centro, mas também não era muito proxima de mais nada.

Cruzei os braços ao peito enquanto esperava a sua resposta e não deixei de sorrir quando finalmente ma deu. Talvez ainda não se tivesse esquecido da minha persistência.
- Como é que é possível que ainda não nos tenhamos encontrado? - levantei ligeiramente as sobrancelhas.- mas ainda bem que isso aconteceu.- ofereci-lhe um doce sorriso.

Bem? Bem? Bem para ela, que mesmo que não andasse com o Martin o mais provavelmente era andar com outro qualquer, e o encontro comigo deveria ser indiferente. Para mim, era totalmente diferente. - Devemos viver em pontas opostas.

Passei as mãos pelo cabelo quando uma brisa mais suave os despenteou e assenti ao que disse, concordando.
- E..- mordi o lábio. Eu tinha de fazer isto.- o que me dizes de irmos tomar um café? - sorri.- para pormos a conversa em dia.

Respirei fundo. Queria ir embora, queria fugir dali. Queria mentir-lhe e dizer que tinha planos, ou que a minha namorada (que não existia) podia não gostar da ideia, ou que ia de férias e por isso é que estava ali, tinha ido dar uma volta de despedida. No entanto, não consegui dizer nenhuma dessas desculpas. A única coisa que me saiu foi: - Claro, porque não? - com um sorriso meio forçado, meio honesto.

De cada vez que o olhava, era assombrada por tantas recordações que o que mais queria era atirar-me para os seus braços e implorar-lhe que me desculpasse por não ter ficado com ele. Era Bernard que eu amava, ainda não conseguia perceber como é que tinha sido capaz. Sorri, genuinamente, quando aceitou o meu pedido e assenti, ajeitando a minha mala ao ombro.
- Vamos então.- murmurei.